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07/01/2011

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Uma noite e aquela noite
Quente como a mão de um amante
Iluminada como a vitória dos fracos
Encontrava-se com o mar
Plano e calmo como um rei deposto

Pisei algumas vezes na areia
Ela me recebia com cortesia
E com um pouco de amargura
Mas éramos amigos, naquela noite
Ela sabia que eu precisava de alguns minutos
Antes de voltar

Ela sabia
Que eu não tinha nenhum filho para brincar
Mas ela me aceitou sem falácia
Ela sabia
Que minha família já não mais existia
Ela a tinha conhecido
Mas como uma grande amiga, não disse nada
Ela sabia
Que meu grande amor estava tão perto
Que ela quase poderia sentir seus pés
Mas ela ficou em silêncio
Me disse: Não o chame!
Como que velando pela minha beleza e tristeza

Talvez ela até sentisse um pouco de inveja
Afinal, seu grande amor estava também muito perto
Porém eternamente separado por um acaso estúpido
Os braços do mar estavam cansados
E agora apenas brincavam de acariciar
Que raiva que ela sentia!

Ela sentia inveja da lua e o do sol
Que não tinham o infortúnio de se encararem
O sofrimento era menor, como uma pílula
Existia nobreza naquilo tudo
Como um orfanato em reforma

O caso dela era patético
Tão patético que ninguém havia falado até hoje
Sobre a história de amor da areia e do mar

É uma vulgaridade, na verdade
Estar no chão
E ninguém pensa nisso
Sonham com astros, com espaçonaves,
Com Deus!
Inventam deuses gregos
Inventam Deus
Inventam uma morada no céu
Agradecem pela chuva
Receiam o vento e os raios
Queimam ao sol como escravos
Inventam Marte!
E estão sempre presos
Como que nascidos cegos ou mudos

Areia, amiga
Você e o mar tiveram azar
Dói lhe dizer isso
Mas o mar ainda tem a cor da nobreza
E as pessoas o veneram extasiadas
Já os cães defecam na sua infinitude
Ignorantes como homens
Eles não se importam com seu esforço!
Mas você é boa, sentimental
Viverá ainda por muito tempo
Alguns percalços não tirarão seu tímido poder

Areia, cada grão é um horror?
Cada grão é uma criança?
Cada grão é um judeu?
Cada grão é um poeta?
Cada grão é um assassino?
O que é esse amontoado amarelo, afinal de contas?
Eu não consigo entender
Como você pode ser tão inteira

Pisar não lhe machuca?
Ser muito delicado é impossível, você sabe
Às vezes eu acredito que você seja pedra
Ou Deus
Ou meu amor
É realmente muito difícil

Você ama o mar, não ama?
Fique aqui com ele
Vocês ainda podem sentir um ao outro
De algum modo...

Viu como é?
Eu queria falar sobre mim
Sobre ele
E acabei lhe destrinchando como um médico
É melhor eu voltar
Antes que me chamem.

Gian Luca

01/01/11

3 comentários:

Kenia Santos disse...

Belíssimamente tecido com ternura e suavidade.

Cada linha uma pérola de um colar de lições que a gente deveria exibir com orgulho no pescoço. =)))

Gian! Claro que vi o selo que vc dedicou ao Poesia Torta, desculpe-me por não ter vindo agradecer antes por esse carinho e gentileza, fim de ano é meio complicado.

Adoro esse blog tão lindo e bem escrito que você cultiva aqui, com muita classe.

Beijo com doçura, querido! =*

Rafael Ayala disse...

Gostei, de verdade.
Por vezes eu também tento falar de mim, mas nem sempre eu tenho controle.
Quando deixamos fluir, sem planejar, parece sair bem melhor, ás vezes.
=]

Dayane Pereira disse...

Olá, quanto tempo não passo por aqui! É a correria, sabe como é. Mas sempre bom visitar um Blog querido e no estilo tão retrô que eu adoro.
Continuar zapeando por aqui.
Bjs